14 de novembro de 2011

Proteção antes do ‘jovem infrator’

Por Erich Vallim Vicente

Em tempos em que os holofotes sobre a Universidade de São Paulo (USP) estão mais focados na polêmica entre reitor e um grupo de estudantes, deixa-se de dar atenção a pesquisas desenvolvidas no principal centro de conhecimento do país e da América Latina. Recentemente, um estudo da socióloga Liana de Paula, da Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, revela que o Estado brasileiro tem focado seus investimentos na recuperação de jovens infratores, “ao invés de criar mecanismos mais efetivos na garantia de seus direitos básicos”.

Parece óbvio, e talvez até não seja tão novo, mas ao acompanhar nove jovens em cumprimento de liberdade assistida, a pesquisadora conseguiu obter informações ainda mais depuradas sobre o que leva um adolescente para o crime. Colocando em miúdos, o seu trabalho destaca que, ao invés de se investir tanto em programas de ressocialização, como os feitos na Fundação Casa (antiga Febem), o estado deveria olhar para a rede de proteção anterior ao crime, sobretudo as escolas.

Como informa matéria no site da USP, o estudo indica que o investimento preventivo melhoraria a qualidade de vida dos jovens e diminuiria, a médio prazo, a proporção de jovens que migram para o crime. Nesta matéria, há declaração da própria socióloga. “Escolas sucateadas ou mal equipadas, problemas de moradia e de saúde são alguns dos fatores que desestimulam os jovens e contribuem para sua exclusão tanto econômica quanto socialmente”, afirmou Liana.

A matéria cita exemplo baseado no depoimento de um dos jovens acompanhados pela socióloga, de 16 anos e cursando o 2o ano do Ensino Médio, o qual diz que tinha aulas de literatura sem livros e sem nenhuma leitura. “Isso nos faz pensar no que as escolas têm para oferecer, sobretudo no que se refere à possibilidade de imaginarem, sonharem e criarem algo diferente da realidade que eles vivem sem que lhes seja dado o acesso, por exemplo, ao universo literário”, questiona Liana.

Recentemente, durante audiência pública do Fórum Permanente Sobre Álcool e Outras Drogas, organizado pelo vereador Bruno Prata (PSDB), na Câmara Municipal, houve o depoimento de dois jovens em liberdade assistida e um deles, atualmente participante de um grupo de teatro, disse imaginar que, se tivesse tido a oportunidade de participar de oficina de atuação, como faz atualmente, dificilmente teria caminhado para o problema das drogas e, por consequência, do roubo. Analisando mais cientificamente, o adolescente estava com sua rede de proteção defasada, só possibilitada depois de cometer o crime. Poderia ter sido evitado.

Num país em que 0,16% dos 25 milhões de jovens entre 12 a 18 anos passam por medidas socioeducativas, é importante criar um olhar mais crítico ao que vem antes da formação do infrator. A chamada “rede de proteção” não pode transformar-se em espécie de “benefício social” a quem passou por medida socioeducativa, mas precisa ser encarada como direito básico, garantido na legislação brasileira.

fonte: A Tribuna

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