27 de agosto de 2014

"Quando vi que teria um filho, fiquei desesperada. Eu não queria gerar mais um aluno"

por Sheila Pelegri de Sá via Facebook

Começo minha manhã psicodélica estrelada com uma leitura triste. No depoimento de uma professora de inglês da rede pública que tentou o suicídio, a seguinte frase: "Quando vi que teria um filho, fiquei desesperada. Eu não queria gerar mais um aluno". Acho que nunca li nada a um tempo tão triste, tão profundo e tão preciso.

Penso que todas as pessoas merecem o respeito de seus semelhantes quando expõem suas limitações físicas e emocionais, desde que essas não comprometam o bem estar das demais. Aquilo que pode parecer (e provavelmente foi diagnosticado como) pânico e depressão em razão de anos de superexposição à violência dentro das salas de aula da periferia me soou, na verdade, como uma profunda lucidez em relação à impotência e ingerência a que todo ser humano se arrisca quando gera outros seres humanos.

A matéria é sobre o caos na educação pública. Uma entre dezenas, centenas, que expõem o que já sabemos há décadas. E que não é "privilégio" das "perifas" brasileiras. Só gente muito ingênua, muito desinformada e muito "vira-latas" acredita que não há caos semelhante ocorrendo agora em outros países, inclusive do "primeiro mundo". E sempre se pode mudar de emprego, é fato. Atentar contra a própria vida é algo que não me aventuro a comentar por hora. Minha tristeza não vai nesta direção. Li meia dúzia de comentários execrando a "esquerda festiva" responsável pela "baderna" nas instituições e nos valores, coisa que era diferente no "tempo dos militares", quando professores, hierarquias e instituições eram respeitados.

A memória ruim, as habilidades cognitivas comprometidas ou a falta de bom senso impedem muitas pessoas, hoje na casa dos 50, 60, 70 anos, de fazerem uma continha bem simples: quem foi educado no tempo dos militares É RESPONSÁVEL pela educação que receberam OS PAIS dessas crianças que hoje aterrorizam - com sua violência e valores - profissionais e cidadãos comuns, nas escolas públicas e privadas. O modelo educacional recebido e louvado com pavoroso saudosismo neste bizarro ano eleitoral era baseado (lembram?) no temor às consequências, na humilhação pública, na disciplina IMPOSTA com rigor e sem qualquer estímulo à reflexão e ao desenvolvimento do senso crítico.

Tivesse sido baseado no RESPEITO e na EMPATIA necessários para a convivência saudável e pacífica entre cidadãos, os PAIS de hoje, educados no pós-militarismo das décadas de 80 e 90 talvez tivessem aprendido dentro de casa algo parecido e sido realmente inspirados a transmitirem aos seus rebentos que arrebentam. Os "filhos" da ditadura geraram genitores permissivos, condescendentes, culpados, negligentes, superficiais, materialistas. Para além das causas sociais da violência - que sou ninguém para discutir - é necessário que RESPONSABILIDADES SEJAM ASSUMIDAS, geração após geração.

Não é uma questão de procurar culpados. De caçar bruxas (las hay, las hay...) Em muitas famílias o acesso e as oportunidades relativas à educação variam muito de geração para geração. Pais que não estudaram na maioria das vezes se esforçam para que os filhos frequentem a escola, por exemplo. Ainda que seja para rasgar o rosto da coleguinha com o lápis afiado aos seis anos, ou para desferir tapas na professora. Pais que estudaram no ensino público e ganham algum dinheiro se debulham para oferecer educação privada aos filhos. Ainda que seja para que eles tratem seus professores como seus funcionários. Pais que cursaram apenas fundamental ou médio querem ver os diplomas universitários dos filhos. Ainda que estes tenham sido conquistados em condições tacanhas, num ciclo perverso de enganadores e enganados. Muitos pais acreditam que estão realmente fazendo o melhor possível. Muitos avós acreditam que no seu tempo era muito melhor. Muitos professores na ativa já jogaram a toalha há tempos e não sou eu quem vai depositar toda a "responsa" nas costas deles. E todas essas pessoas votam.




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