De todas as mazelas da escola pública (só para relembrar: faltam as mínimas condições de trabalho, alunos com famílias desestruturadas, má conservação e precarização dos prédios escolares, salas lotadas, baixos salários etc. etc.) uma coisa temos que admitir que era boa – liberdade na forma de conduzir o processo ensino aprendizagem.
Essa liberdade com que estão tentando acabar era o que mais se assemelhava à verdadeira prática de ensinar e aprender por gosto, não por cobrança e imposição para se destacar em estatísticas oficiais; era a que mais lembrava, talvez, os grandes pensadores que, reunidos por afinidade, discutiam aquilo em que tinham interesse e com isso existia um prazer mútuo no processo educacional.
Agora, as influências do neoliberalismo pedem passagem: o importante é quantificar. Notas altas, estatísticas aceitáveis e padronizadas por aqueles que impõem uma maneira de pensar, números, tudo isso com a explícita intenção de promover o cálculo e a leitura. O raciocínio que liberta e que questiona as políticas públicas, que faz generalizações mais requintadas, não são prioridade para a massa.
Num mundo onde a disputa gera guerras, corrupção e mortes, ouvimos discursos atormentados de que devemos premiar os bons professores. O que seria um bom professor? Aquele que obedece? Aquele que aceita? Ou que não tem voz ativa? O que não tem vez? Aquele que está devendo no especial com um mísero salário de aproximadamente três mínimos paulistas? Ah! Não sei se é bom ser bom professor. Será que o mundo está invertido? Como não considerar um professor que conversa sobre o final de semana, tão real e decisivo para a vida do aluno e do professor, que conversa de gente para gente, em que os dados mais significativos são o sentir, o contato entre seres humanos, a troca de experiências entre pessoas com pontos de vistas e vivências diferentes, que produz as maiores dádivas da humanidade, o verdadeiro saber com dons de aprendizagem própria sem a imposição de uma instituição que representa a ideologia de uma classe?
Estão nos roubando isso! Quando educadores de gabinete falam que professores não querem trabalhar, isso me assusta. Nós, heróis de lousa e giz, de enfrentar sem medo classes cheias, sendo que muitas delas com alunos provenientes de situações sociais trágicas, sofrendo agressões e, apesar de tudo, com uma ternura inexplicável e inintelegível que é capaz de despertar nos alunos algum interesse pela vida, vida essa de que ele está prestes a desistir!
A educação é um processo dos mais complicados, em que estão envolvidos professores, coordenadores, diretores, secretários, famílias, sociedade em geral, a idiossincrasia dos alunos e a legislação. Culpar apenas um dos envolvidos é incoerência. É desconhecimento de causa. É coisa de quem não está na sala de aula.
Acreditamos que a melhora tem que vir. Não temos todos os meios infalíveis para isso, escapa de nossa capacidade ditar sozinho o que é melhor. Temos consciência de que preservar as poucas coisas boas da escola pública é interessante, de que ter um conteúdo em comum para trabalhar também é, porém tolher a liberdade de conduzir o processo de ensino aprendizagem não é bom. Nesse discurso de aprender a aprender por que o alto escalão da educação não tenta aprender um pouco com quem está na sala de aula? Será que não merecemos crédito?
O solo pode até estar fértil para se semear coisas boas, mas jogaram a semente errada.
Alexandre de Freitas é professor de Geografia na rede estadual de ensino e membro da equipe do blog Sala dos Professores.
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