As escolas públicas do Estado de São Paulo acabam de receber uma série de pacotes de livros que deverão ser doados aos alunos no início do ano de 2009. Não, não se trata de livros didáticos, mas sim de clássicos da Literatura Brasileira, como Machado de Assis, Clarice Lispector, Manuel Bandeira e Manoel de Barros. A iniciativa parece nobre demais para merecer alguma crítica, principalmente porque estimular a leitura é o principal objetivo pelo qual nós, professores, trabalhamos continuamente em sala de aula. Mas, como apenas intenções não bastam, creio que a iniciativa merece um questionamento.
A primeira dúvida levantada pela maioria dos professores, depois de um ano de sucessivas perdas sofridas pela categoria, é a razão de se investir em material destinado aos alunos em vez de melhorar as condições gerais da escola ou os vencimentos dos professores. Realmente, de nada adianta investir centenas de milhões de reais em livros que depois acabam não sendo utilizados, ou então sendo mal utilizados, por conta da obrigatoriedade de se seguir à risca os mal elaborados “Cadernos do Professor”, outro enorme dispêndio de recursos públicos. Foi o que aconteceu aos livros didáticos distribuídos no início deste ano.
Depois, fica a questão de se o estímulo à leitura possa ser dado pela simples posse de alguns volumes, quando as bibliotecas continuam abarrotadas de excelentes títulos, tanto das literaturas de Língua Portuguesa quanto da Literatura Universal, em ótimas traduções. E não se diga que muitas escolas não dispõem de bibliotecas, pois o dinheiro investido nesses exemplares a serem doados aos alunos seria mais que suficiente para pelo menos dar início a uma boa coleção nessas Unidades Escolares.
Finalmente, se a nossa tão bem informada secretária, que tanto aprecia estatísticas e estudos internacionais, tivesse simplesmente lido um livro intitulado Freakonomics, do economista estadunidense Steven Levitt, saberia que, ao contrário do que pensa o senso comum, iniciativas como essa, que também foram implementadas nos EUA, não influenciam no rendimento escolar.
É importante não confundir causalidade e correlação. Já escrevi sobre isso no meu artigo Entre alhos e bugalhos. De fato, constatou-se uma correlação entre ter muitos livros em casa e apresentar boas notas no boletim, mas isso não significa que haja um nexo causal entre os dois fatores. Pelo mesmo método estatístico, constatou-se que crianças com poucos livros em casa, mas que frequentavam bibliotecas e museus, ainda tinham notas mais baixas que aquelas que possuíam livros mas que não tinham o hábito da leitura. Como se explica isso? A hipótese de Levitt é a de que a mera posse de livros não é uma causa, mas apenas um indício de pais mais intelectualizados, que passariam aos seus descendentes seu nível mais elevado de QI. Em outras palavras, o programa de distribuição de livros aos alunos não surtiu os efeitos esperados simplesmente porque a inteligência é o resultado de fatores preponderantemente genéticos.
Pode ser difícil aos profissionais da educação admitirem isso, pois equivale a diminuir sua importância na formação dos jovens. Apesar disso, essa é a realidade revelada pelos dados – pelo menos a realidade norte-americana. É preciso muito tato ao interpretar dados estatísticos, especialmente quando relacionamos características supostamente fenotípicas (quer dizer, geradas por fatores genéticos). Se a explicação de Levitt estiver correta, nenhum professor, por melhor que seja, poderá transformar uma criança de parcos recursos hereditários em um gênio. Mas isso não significa que, aos favorecidos geneticamente, bastem suas fitas de ácido desoxirribonucléico para resolver uma equação de segundo grau ou para descobrir os encantos dos olhos de ressaca de Capitu. Os fatores genéticos não determinam a inteligência, apenas a possibilitam. E é aí que o professor se mostra indispensável.
Ora, onde é que o estado pode interferir para otimizar o “processo de ensino-aprendizagem”? Interferir na seleção natural dos melhores grupos genéticos é possível por meios de controle complicados, dispendiosos e de muito longo prazo – chama-se eugenia, e foi prática comum dos nazistas. Apesar do rótulo negativo, não sou contra ela, em princípio (o que não significa que eu concorde com o uso que os nazistas acabaram por fazer dela!). A outra ponta do processo termina na sala de aula. É ali que o estado pode interferir mais diretamente, dando aos professores e alunos melhores condições materiais. Isso inclui, é claro, escolas bem aparelhadas, com bibliotecas, laboratórios de ciências e de informática, equipamentos adequados para Educação Física etc. Mas começa antes disso, com professores bem preparados, satisfeitos com sua profissão, que disponham de tempo livre e de recursos financeiros para investir em seu aperfeiçoamento contínuo. Aí então faria sentido qualquer tipo de cobrança intelectual ao corpo docente da rede pública.
A política tucana é bem outra. Propõe o ensino de esgrima (!) nas aulas de Educação Física, com espadas… de jornal. Mantém a classe docente frustrada com seus baixos salários e péssimas condições de trabalho, e aí exige que prestem uma prova para poder continuar lecionando no próximo ano. A provinha (sim, ela já é chamada no diminutivo pelos corredores) é só mais uma forma de jogar dinheiro fora, porque não evitará o grande contingente de professores temporários que continuará atuando na rede. Eles nem serão efetivados, nem terão condições de se aperfeiçoarem. A não ser que a dona Maria Helena considere um grande aperfeiçoamento ler sua Proposta Curricular, que é a única matéria que vai cair na provinha.
O pior é que já estamos acostumados a esse esbanjamento de recursos públicos. O exemplo mais recente foi a aplicação de outra provinha, o Saresp. Parece que o Estado de São Paulo não dispõe de uma instituição competente para uma prova desse nível, porque recorreu à não menos incompetente Fundação Cesgranrio, que, depois de sofrer o revertério de ter as provas inutilizadas pela chuva (!), não tendo conseguido, tampouco, número suficiente de inscritos para aplicá-las (já que, para total isenção, exigia-se que os aplicadores não pertencessem ao quadro do magistério), resolveu transformar essas pessoas em “monitores”, que receberam quase um salário mínimo por apenas dois dias sem fazer absolutamente nada, enquanto professores efetivos foram designados para aplicar as provas, mesmo fora dos seus horários de aula, sem receber nada por isso! Caso mais recente, mas certamente não o último. Podem esperar para ver só aonde vão parar os 5 bilhõezinhos arrecadados com a estapafúrdia e ridícula privatização do banco Caixa Nostra.
A primeira dúvida levantada pela maioria dos professores, depois de um ano de sucessivas perdas sofridas pela categoria, é a razão de se investir em material destinado aos alunos em vez de melhorar as condições gerais da escola ou os vencimentos dos professores. Realmente, de nada adianta investir centenas de milhões de reais em livros que depois acabam não sendo utilizados, ou então sendo mal utilizados, por conta da obrigatoriedade de se seguir à risca os mal elaborados “Cadernos do Professor”, outro enorme dispêndio de recursos públicos. Foi o que aconteceu aos livros didáticos distribuídos no início deste ano.
Depois, fica a questão de se o estímulo à leitura possa ser dado pela simples posse de alguns volumes, quando as bibliotecas continuam abarrotadas de excelentes títulos, tanto das literaturas de Língua Portuguesa quanto da Literatura Universal, em ótimas traduções. E não se diga que muitas escolas não dispõem de bibliotecas, pois o dinheiro investido nesses exemplares a serem doados aos alunos seria mais que suficiente para pelo menos dar início a uma boa coleção nessas Unidades Escolares.
Finalmente, se a nossa tão bem informada secretária, que tanto aprecia estatísticas e estudos internacionais, tivesse simplesmente lido um livro intitulado Freakonomics, do economista estadunidense Steven Levitt, saberia que, ao contrário do que pensa o senso comum, iniciativas como essa, que também foram implementadas nos EUA, não influenciam no rendimento escolar.
É importante não confundir causalidade e correlação. Já escrevi sobre isso no meu artigo Entre alhos e bugalhos. De fato, constatou-se uma correlação entre ter muitos livros em casa e apresentar boas notas no boletim, mas isso não significa que haja um nexo causal entre os dois fatores. Pelo mesmo método estatístico, constatou-se que crianças com poucos livros em casa, mas que frequentavam bibliotecas e museus, ainda tinham notas mais baixas que aquelas que possuíam livros mas que não tinham o hábito da leitura. Como se explica isso? A hipótese de Levitt é a de que a mera posse de livros não é uma causa, mas apenas um indício de pais mais intelectualizados, que passariam aos seus descendentes seu nível mais elevado de QI. Em outras palavras, o programa de distribuição de livros aos alunos não surtiu os efeitos esperados simplesmente porque a inteligência é o resultado de fatores preponderantemente genéticos.
Pode ser difícil aos profissionais da educação admitirem isso, pois equivale a diminuir sua importância na formação dos jovens. Apesar disso, essa é a realidade revelada pelos dados – pelo menos a realidade norte-americana. É preciso muito tato ao interpretar dados estatísticos, especialmente quando relacionamos características supostamente fenotípicas (quer dizer, geradas por fatores genéticos). Se a explicação de Levitt estiver correta, nenhum professor, por melhor que seja, poderá transformar uma criança de parcos recursos hereditários em um gênio. Mas isso não significa que, aos favorecidos geneticamente, bastem suas fitas de ácido desoxirribonucléico para resolver uma equação de segundo grau ou para descobrir os encantos dos olhos de ressaca de Capitu. Os fatores genéticos não determinam a inteligência, apenas a possibilitam. E é aí que o professor se mostra indispensável.
Ora, onde é que o estado pode interferir para otimizar o “processo de ensino-aprendizagem”? Interferir na seleção natural dos melhores grupos genéticos é possível por meios de controle complicados, dispendiosos e de muito longo prazo – chama-se eugenia, e foi prática comum dos nazistas. Apesar do rótulo negativo, não sou contra ela, em princípio (o que não significa que eu concorde com o uso que os nazistas acabaram por fazer dela!). A outra ponta do processo termina na sala de aula. É ali que o estado pode interferir mais diretamente, dando aos professores e alunos melhores condições materiais. Isso inclui, é claro, escolas bem aparelhadas, com bibliotecas, laboratórios de ciências e de informática, equipamentos adequados para Educação Física etc. Mas começa antes disso, com professores bem preparados, satisfeitos com sua profissão, que disponham de tempo livre e de recursos financeiros para investir em seu aperfeiçoamento contínuo. Aí então faria sentido qualquer tipo de cobrança intelectual ao corpo docente da rede pública.
A política tucana é bem outra. Propõe o ensino de esgrima (!) nas aulas de Educação Física, com espadas… de jornal. Mantém a classe docente frustrada com seus baixos salários e péssimas condições de trabalho, e aí exige que prestem uma prova para poder continuar lecionando no próximo ano. A provinha (sim, ela já é chamada no diminutivo pelos corredores) é só mais uma forma de jogar dinheiro fora, porque não evitará o grande contingente de professores temporários que continuará atuando na rede. Eles nem serão efetivados, nem terão condições de se aperfeiçoarem. A não ser que a dona Maria Helena considere um grande aperfeiçoamento ler sua Proposta Curricular, que é a única matéria que vai cair na provinha.
O pior é que já estamos acostumados a esse esbanjamento de recursos públicos. O exemplo mais recente foi a aplicação de outra provinha, o Saresp. Parece que o Estado de São Paulo não dispõe de uma instituição competente para uma prova desse nível, porque recorreu à não menos incompetente Fundação Cesgranrio, que, depois de sofrer o revertério de ter as provas inutilizadas pela chuva (!), não tendo conseguido, tampouco, número suficiente de inscritos para aplicá-las (já que, para total isenção, exigia-se que os aplicadores não pertencessem ao quadro do magistério), resolveu transformar essas pessoas em “monitores”, que receberam quase um salário mínimo por apenas dois dias sem fazer absolutamente nada, enquanto professores efetivos foram designados para aplicar as provas, mesmo fora dos seus horários de aula, sem receber nada por isso! Caso mais recente, mas certamente não o último. Podem esperar para ver só aonde vão parar os 5 bilhõezinhos arrecadados com a estapafúrdia e ridícula privatização do banco Caixa Nostra.
2 comentários:
Poha...
Agora que eu sai da escola
eles vão dar Livros? hehe
Bom se todos alunos se dispusessem a ler ao menos 1 desses livros.. Seria ótimo...Mas como todos nós sabemos que não acontece... Dinheiro jogano no lixo...
Ahh, aqui quem tá escrevendo é o Fernando Peracini
Olá;
Elaborei em meu site uma enquête sobre os conflitos na Faixa de Gaza, e gostaria de saber a sua opinião sobre o assunto.
Link da enquête: http://www.geraldo.890m.com/enquete.htm
Desde já agradeço
Geraldo José
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